sábado, 5 de março de 2022

O legado de Bauman

 





 

Resumo: Diante do inefável legado de Zygmunt Bauman para a sociologia e filosofia, há também um legado para as Ciências Jurídicas, onde a dinâmica e a fluidez exigem da doutrina e da jurisprudência novas habilidades para se manterem eficazes e coerentes.

Palavras-Chave: Modernidade Líquida. Direito. Doutrina. Jurisprudência. Sociologia. Filosofia.

 

 

Zygmunt Bauman (1927-2017) foi sociólogo, filósofo, professor e escritor polonês, foi uma das vozes mais contundentes da sociedade contemporânea e criador da expressão "modernidade líquida" para classificar a intensa fluidez do mundo atual onde os indivíduos não possuem mais padrão de referência.

Nasceu na Polônia, na cidade de Poznan, filho de judeus, e em 1939, junto com sua família escapou da invasão das tropas nazistas na Polônia, tendo se refugiado na União Soviética (URSS). Alistou-se no exército polonês e

atuou no front soviética. Em 1940 ingressou no Partido Operário Unificado, partido comunista da Polônia. E, em 1945 entrou para o Serviço de Inteligência Militar, onde permaneceu durante três anos.

Com o término da Segunda Guerra Mundial, voltou para Varsóvia. E, conciliou sua carreira militar com os estudos universitários e também com sua militância partidária. Estudou Sociologia na Academia de Política e Ciências Sociais de Varsóvia.

Ingressou no mestrado na Universidade de Varsóvia. E, em 1950 deixou o Partido Operário. E, em 1953 foi expulso do Exército da Polônia. E, em 1954 concluiu o mestrado e, se tornou professor assistente de Sociologia na mesma Universidade. Durante muitos anos se manteve próximo à ortodoxia marxista, porém, depois passou a fazer severas críticas ao governo comunista da Polônia, o que resultou em sérias perseguições durante quinze anos.

E, em março de 1968, em protestos de professores, estudantes e artistas que lutavam contra a censura do regime polonês, que culminou com expurgo antissemita e, assim, obrigou a muitos poloneses de origem judaica a deixarem o país. E, assim, foi exilado em Israel, onde lecionou na Universidade de Tel-Aviv. Em 1971 foi convidado para lecionar Sociologia na Universidade de Leeds, na Inglaterra, onde também dirigiu o departamento de sociologia da Universidade até sua aposentadoria em 1990.

Durante mais de meio século foi um dos mais influentes observadores da realidade social e política, apesar de ser descrito como pessimista, endossou o coro dos que criticam a pós-modernidade, em busca de causas do processo social perverso, no mundo das ideias do pensamento anticapitalista.

Em 2000 criou o termo "modernidade líquida" para descrever as transformações do mundo contemporâneo, no qual nada é sólido e tudo se dilui no ar. Sua derradeira obra é intitulada "Estranhos à Nossa Porta" observa a crise dos refugiados que batem à porta da Europa.

A modernidade líquida parte do pressuposto de que, no passado, tudo era sólido. Assim, por exemplo: uma família tinha um pai, mãe e punhado de filhos. Doravante, o mundo estaria mais líquido.

Ou pelo menos, os conceitos se tornaram mais ambíguos. E, as famílias líquidas passaram a ser aceitas com naturalidade. E, hoje em dia, até mesmo um bando de solteiros ou solteiras que moram juntos pode ser considerada como família.

Para Bauman, não apenas as famílias que estão mais líquidas, mas também o mundo. Na vida profissional, um desses sintomas é a instabilidade das carreiras.

E, essa liquidez interfere até na hora de ter medo, pois ao invés de se ter um nítido inimigo, surge o terrorismo, que pode estar e atacar em qualquer lugar.

Não é porque o sociólogo polonês passou a entender o mundo, que ele passou a concordar com tudo que vige e dinamiza-se por aí. Ao revés, tornou-se crítico do consumismo exacerbado, o sociólogo reclama que fluidez tornou mais flexíveis os valores importantes, tal como a relação humana, o respeito, o amor e  comprometimento. E, curiosamente, foi a defesa de valores sólidos que fez de Bauman um dos pensadores contemporâneos mais importantes.

Vejamos alguns de seus pensamentos, in litteris:

Conheça um pouco do pensamento de Bauman:

“O medo está lá, saturando diariamente a existência humana, enquanto a desregulamentação penetra profundamente nos seus alicerces e os bastiões de defesa da sociedade civil desabam. O medo está lá – e recorrer a seus suprimentos aparentemente inexauríveis e avidamente renovados a fim de reconstruir um capital político depauperado é uma tentação à qual muitos políticos acham difícil resistir. E a estratégia de lucrar com o medo está igualmente bem arraigada, na verdade uma tradição que remonta aos anos iniciais do ataque liberal ao Estado social.” In:  Zygmunt Bauman, em “Tempos líquidos”. [tradução Carlos Alberto Medeiros].Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007, p. 23.

“Massas cada vez maiores de pessoas desperdiçadas no equilíbrio político e social da coexistência humana planetária. A consequência da globalização do mercado financeiro e de trabalho, da modernização administrativa pelo capital, do modo de vida moderno, colaboram para os “escoadouros” humanos, excluindo os não pertencentes ao meio. […] A vida moderna produz uma “escala crescente: a população supérflua, supranumerária e irrelevante – a grande quantidade de sobras do mercado de trabalho e o refugo da economia orientada para o mercado, acima da capacidade dos dispositivos de reciclagem.”

In: Zygmunt Bauman, em “Tempos líquidos”. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007, p. 35.

“Transformações sociais, culturais e políticas associadas à passagem do estágio “sólido” para o estágio “líquido” da modernidade, o afastamento da nova elite (localmente estabelecida, mas globalmente orientada e apenas ligada de forma distante ao lugar em que se instalou) de seu antigo compromisso com a população local e a resultante brecha espiritual/ comunicacional.” In: Zygmunt Bauman, em “Tempos líquidos”. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007, p. 84.

“Pensar tira nossa mente da tarefa em curso, que requer sempre a corrida e a manutenção da velocidade. E na falta do pensamento, o patinar sobre o gelo fino que é uma fatalidade para todos os indivíduos frágeis na realidade porosa pode ser equivocadamente tomado como seu destino.” In: Zygmunt Bauman, trecho do livro “Modernidade líquida”. [tradução Plinio Dentzien]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2001.

“Tomar distância, tomar tempo – a fim de separar o destino e a fatalidade, de emancipar o destino da fatalidade, de torná-lo livre para confrontar a fatalidade e desafiá-la: essa é a vocação da sociologia. E é o que os sociólogos pode fazer caso de esforcem consciente, deliberada e honestamente para refundir a vocação a que atendem – sua fatalidade – em seu destino.” In: Zygmunt Bauman, trecho do livro “Modernidade líquida”. [tradução Plinio Dentzien]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2001.

 

“Nós somos responsáveis pelo outro, estando atento a isto ou não, desejando ou não, torcendo positivamente ou indo contra, pela simples razão de que, em nosso mundo globalizado, tudo o que fazemos (ou deixamos de fazer) tem impacto na vida de todo mundo e tudo o que as pessoas fazem (ou se privam de fazer) acaba afetando nossas vidas.”

In: Zygmunt Bauman, trecho do livro “Modernidade líquida”. [tradução Plinio Dentzien]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2001.

Eis a lista de obras de Bauman já publicadas no Brasil:

 Ética pós-moderna, de Zygmunt Bauman. [tradução João Rezende Costa]. 1ª ed., São Paulo: Paulus Editora, 1997.

Modernidade e holocausto, de Zygmunt Bauman. [tradução Marcus Antunes Penchel]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Zahar, 1998.

Modernidade e ambivalência, de Zygmunt Bauman. [tradução Marcus Antunes Penchel]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Zahar, 1999.

Globalização: as consequências humanas, de Zygmunt Bauman. [tradução Marcus Penchel]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Zahar, 1999.

O mal-estar da pós-modernidade, de Zygmunt Bauman. [tradução Cláudia Martinelli Gama e Mauro Gama]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Zahar, 1999.

Em busca da política, de Zygmunt Bauman. [tradução Marcus Antunes Penchel]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Zahar, 2000.

 Modernidade líquida, de Zygmunt Bauman. [tradução Plinio Dentzien]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2001.

Comunidade: a busca por segurança no mundo atual, de Zygmunt Bauman. [tradução Plinio Dentzien]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2003.

Amor líquido, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2004.

Vidas desperdiçadas, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2005.

Identidade, de Zygmunt Bauman. (Entrevista a Benedetto Vecchi). [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2005.

Europa – uma aventura inacabada, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2005.

Vida líquida, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 2ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2007.

Tempos líquidos, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2007.

Medo líquido, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2008.

Vida para consumo, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2008.

A sociedade individualizada – vidas contadas e histórias vividas, de Zygmunt Bauman. [tradução José Gradel]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2008.

Confiança e medo na cidade, de Zygmunt Bauman. [tradução Eliana Aguiar]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2009.

A arte da vida, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2009.

 Capitalismo parasitário, de Zygmunt Bauman. [tradução Eliana Aguiar]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2010.

Legisladores e intérpretes, de Zygmunt Bauman. [tradução Renato Aguiar]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2010.

A ética é possível num mundo de consumidores? de Zygmunt Bauman. [tradução Alexandre Vieira Werneck]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2010.

Aprendendo a pensar com a sociologia, de Zygmunt Bauman e Tim May. [tradução

Alexandre Vieira Werneck]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2010.

A vida a crédito, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2010.

Bauman sobre Bauman, de Zygmunt Bauman. (Biografia) [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2011.

Vida em fragmentos – sobre a ética pós-moderna, de Zygmunt Bauman.[tradução Alexandre Vieira Werneck]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2011.

44 cartas do mundo líquido moderno, de Zygmunt Bauman. [tradução Vera Pereira]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2011.

Ensaios sobre o conceito de cultura, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2012.

A cultura no mundo líquido moderno, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2012.

Isto não é um diário, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2012.

Sobre a educação e juventude, de Zygmunt Bauman. (Conversas com Riccardo Mazzeo).. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2013.

Danos colaterais – desigualdades sociais numa era global, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2013.

Vigilância líquida, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2014.

Cegueira moral: a perda da sensibilidade na modernidade líquida, de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2014.

A riqueza de poucos beneficia todos nós?, de Zygmunt Bauman. [tradução Renato Aguiar]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2014.

Para que serve a sociologia? de Zygmunt Bauman. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2015.

Estado de crise, de Zygmunt Bauman e Carlo Bordoni. [tradução Renato Aguiar]. Rio de Janeiro: Zahar, 2016.

O retorno do pêndulo: Sobre a psicanálise e o futuro do mundo líquido, de Zygmunt Bauman e Gustavo Dessal. [tradução Joana Angélica d’Avila Melo]. Rio de Janeiro: Zahar, 2017.

Retrotopia, de Zygmunt Bauman. [tradução Renato Aguiar]. Rio de Janeiro: Zahar, 2017.

A individualidade numa época de incertezas, de Zygmunt Bauman e Rein Raud. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.

Nascidos em tempos líquidos: Transformações no terceiro milênio, de Zygmunt Bauman e Thomas Leoncini. [tradução Joana Angélica d’Avila Melo]. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.

Mal líquido: Vivendo num mundo sem alternativas, de Zygmunt Bauman e Leonidas Donskis. [tradução Carlos Alberto Medeiros]. Rio de Janeiro: Zahar, 2019.

Livros sobre Zygmunt Bauman

SILVA, Paulo Fernando da. Conceito de ética na contemporaneidade segundo Bauman. São Paulo: FEU – Fundação Editora Unesp); Cultura Acadêmica, 2013.

 

Nove frases memoráveis para lembrar Zygmunt Bauman in:

El País Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2017/01/09/cultura/1483983882_874557.html Acesso em 11.01.2022.

1. “As redes sociais são uma armadilha”.

2. “O velho limite sagrado entre o horário de trabalho e o tempo pessoal desapareceu. Estamos permanentemente disponíveis, sempre no posto de trabalho”.

3. “Tudo é mais fácil na vida virtual, mas perdemos a arte das relações sociais e da amizade”.

4. “Esquecemos o amor, a amizade, os sentimentos, o trabalho bem-feito. O que se consome, o que se compra, são apenas sedativos morais que tranquilizam seus escrúpulos éticos”.

5. “O movimento [espanhol] de 15 de março é emocional, carece de pensamento”.

6. “Os grupos de amigos ou as comunidades de bairro não te aceitam sem dar razão, mas ser membro de um grupo no Facebook é facílimo. Você pode ter mais de 500 contatos sem sair de casa, você aperta um botão e pronto”.

7. “Foi uma catástrofe arrastar a classe média à precariedade. O conflito não é mais entre classes, é de cada um com a sociedade”.

8. “As desigualdades sempre existiram, mas de vários séculos para cá se acreditou que a educação podia restabelecer a igualdade de oportunidades. Agora, 51% dos jovens diplomados estão desempregados e aqueles que têm trabalho têm empregos muito abaixo das suas qualificações. As grandes mudanças na história nunca vieram dos pobres, mas da frustração das pessoas com grandes expectativas que nunca se cumpriram”.

9. “A possibilidade de que o Reino Unido funcione sem a Europa é mínima”, disse em 2011.

Continuando:

 

Na era da informação, a invisibilidade é equivalente à morte.

Nenhuma sociedade que esquece a arte de questionar pode esperar encontrar respostas para os problemas que a afligem.

Os tempos são líquidos porque, assim como a água, tudo muda muito rapidamente. Na sociedade contemporânea, nada é feito para durar.

A vida é muito maior que a soma de seus momentos.

A incerteza foi sempre o chão familiar da escolha.

A única coisa que podemos ter certeza é a incerteza.

A paixão por se fazer notar é um exemplo importante, talvez o mais gritante, dos nossos tempos, nos quais a versão atualizada do cogito (penso) de Descartes seria: 'Sou visto (observado, notado, registrado), logo existo'.

Analisando como a modernidade líquida afeta as Ciências Jurídicas, segundo Renata Malta Vilas-Bôas, in litteris:

Se vivemos em uma modernidade líquida logo o direito acabou também sendo um “direito líquido”. Não no sentido jurídico, mas sim no sentido apontado por Bauman…

E esse direito líquido reflete-se em doutrinas superficiais, em que a reflexão jurídica fica prejudicada, a ausência de comprometimento tanto com  o estudo quanto com a responsabilidade do que se está dizendo e colocando – principalmente nas redes sociais. Surgem inúmeros “juristas de Facebook/Instagram”,  levando conceitos incompletos ou até mesmo errados para os seus seguidores.

(In: VILAS-BOAS, Renata Malta. Na Modernidade Líquida o Direito também é líquido? Disponível em: https://estadodedireito.com.br/na-modernidade-liquida-o-direito-tambem-e-liquido/ Acesso em 11.01.2022).

Já Mauro Gaudêncio Júnior Teixeira, aponta os desafios da nova hermenêutica constitucional, pois a modernidade líquida afetou também a interpretação constitucional na aproximação de uma visão dogmática constitucional: das identidades autoconstituídas que devem ser suficientemente sólidas para serem reconhecidas como tais e ao mesmo tempo flexíveis o suficiente para não impedir a liberdade de movimentos futuros em circunstâncias constantemente cambiantes e voláteis. [...]

 Ou a notória dificuldade de generalizar as experiências, vividas como inteiramente pessoais e subjetivas, em problemas que possam ser inscritos na agenda pública e tornar-se questões de políticas públicas (BAUMAN, 2010, p.56).

Júnior Teixeira apud Luís Roberto Barroso, aponta em sua obra três grandes transformações teóricas que revolucionaram o conhecimento tradicional relativamente à aplicação do direito constitucional, a saber: a) o reconhecimento de força normativa à Constituição; b) a expansão da jurisdição constitucional; c) o desenvolvimento de uma nova dogmática de interpretação.

O que contribui para contribuir as mudanças paradigmáticas sobre da Teoria da Constituição, trouxeram contribuições significativas para modelo jurídico institucional vigente em nosso país.

Há casos difíceis ou hard cases que decorrem da colisão de normas constitucionais, de questões morais, onde o papel do aplicador (julgador) ascenderá para criar a solução constitucionalmente adequada para o caso concreto. (In: JÚNIOR TEIXEIRA, Mauro Gaudêncio. Modernidade líquida. Os desafios da norma hermenêutica constitucional. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24722/modernidade-liquida Acesso em 11.01.2022).

Estamos vivenciando a era de grupos de referência predeterminados a uma outra comparação universal, em que a autoconstrução individual pode influenciar de forma positiva o processo de interpretação da norma, fomentando à participação da sociedade na condição de destinatários da norma, seja como cointérpretes, conforme já explicava o doutrinador Haberle em sua obra intitulada Hermenêutica Constitucional, ao propor uma hermenêutica democrática, fazendo prevalecer a vontade da Constituição.  Afinal, deve-se realçar a relevância dos mecanismo que disseminem a vontade da Constituição, como a inclusão e a garantia e acesso aos direitos consagrados em nossa Constituição.

Lidar com a fluidez constante dos fatos e valores afetam o Direito e, lidar com isso é um dos desafios da Justiça, segundo o historiador Leandro Karnal. Pois afinal, nesse mundo líquido a autoridade é diluída, onde as realidades são dinâmicas e rápidas. Vivenciamos mudanças permanentes e, que não dependem da consciência e da vontade humana. Assim, temos opções, a saber: ou me transformo e me adapto ou eu paro e, então, a transformação passa por mim.

 

Referências

BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 3ª ed., São Paulo: Saraiva, 2011.

BAUMAN, Zygmunt. Legisladores e Intérpretes. Tradução de: Renato Aguiar, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2010.

DE VASCONCELLOS, Marcos. Realidade descrita por Zygmunt Bauman desafia o Direito e a Justiça. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2017-jan-09/realidade-descrita-zygmunt-bauman-desafia-direito-justica Acesso em 11.01.2022.

HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional – A Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição: Contribuição para a Interpretação Pluralista e “Procedimental” da Constituição. Tradução de: Gilmar Ferreira Mendes, Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1997, reimp. 2002.

HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1991.

 


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